Simbolismo do abandono

Graz, Áustria.
Sonhei que esperava alguém por horas no estacionamento, e esse alguém sabia que eu estava lá — e, por isso, não foi. Acordei às 3h20 pensando nisso, nos lugares onde eu me coloco, lugares que não me querem — onde não sou amada, vista, requisitada.
Lembrei de todas as vezes em que alterei a consciência e me sentia estranha no meu corpo, como se aquilo não me pertencesse. Sentia-me pesada. Sempre associei isso a estar gorda, mas hoje penso que pode ter relação com o emocional, com o energético. Pesada emocionalmente. As coisas que carrego não me pertencem — pertencem a eles: o olhar deles, o medo deles, o trauma deles. Eu queria tirar tudo isso de mim e me sentir como realmente sou.
Às vezes, sinto que minha vida acontece nos intervalos. Nos minutos em que espero, nos segundos em que hesito, nas pausas antes da palavra que não digo. Há um silêncio que me veste, e ele pesa mais do que qualquer carne. Pesa como o não-dito, como a ausência dos que nunca chegaram — não por impossibilidade, mas por decisão. Escolhas alheias que se infiltram nas minhas veias como se fossem minhas.
Cresci moldando meu corpo para caber em espaços que não me foram feitos. Minha mãe dizia que eu era geniosa, meu pai, que era "igual a tia Laine, a tia que nunca casou". Seja educada, ria da piada machista, pinte as unhas de cores claras.Tudo isso para agradar uma expectativa que nunca foi verdadeiramente minha. E, quando olhava no espelho, não me reconhecia. O reflexo mostrava um rascunho. Um corpo habitado por fantasmas que nunca expulsei. Não por medo deles, mas por medo de ficar vazia.
Agora entendo: o que chamava de estranhamento talvez fosse um grito por desapego. Não sou os afetos que me negaram, nem os pesos que me impuseram. Quero me desvestir dessa memória costurada com a linha da culpa. Quero me olhar como quem encontra pela primeira vez a própria casa — desabitada, sim, mas cheia de janelas abertas.